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quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Os exoplanetas habitáveis

Da Folha


Gêmea da Terra será descoberta em dois anos, afirma cientista.
Suíço Michel Mayor ajudou a achar 150 de 350 planetas fora do Sistema Solar
Para o pesquisador, avanço das técnicas de detecção ajudará a flagrar astro como o lar do homem; próxima fase é ver se pode ter vida
25/abril/07 ESO/France Presse

RAFAEL GARCIA

ENVIADO ESPECIAL AO RIO DE JANEIRO
O astrônomo Michel Mayor, da Universidade de Genebra (Suíça), diz que a ciência nunca esteve tão perto de achar um planeta “gêmeo” da Terra fora do Sistema Solar. “Temos grande chance de fazer isso nos próximos dois anos”, afirma.
Mayor está hoje no Rio para falar sobre o que aprendeu desde que achou o primeiro exoplaneta (planeta fora do Sistema Solar) conhecido, orbitando a estrela 51 Pegasi, em 1995.
Ele foi pioneiro no uso da técnica para medir o movimento de estrelas analisando distorções na frequência de sua luz -o chamado efeito Doppler. Quando um planeta gira em torno de seu sol, ele o faz “rebolar” um pouquinho, e a velocidade desse rebolado pode ser detectada assim.
Em entrevista num dos intervalos da assembleia da IAU (União Astronômica Internacional), Mayor disse o que espera ver nos próximos anos.

FOLHA – O que o sr. veio apresentar no encontro aqui no Rio?
MICHEL MAYOR -
Vim mostrar que aquilo que descobrimos nos últimos dois anos foi uma grande população de planetas de baixa massa. Isso significa massas poucas vezes maiores que a da Terra ou a massa de Netuno. Mais ou menos entre 5 e 20 vezes a massa da Terra. Essa população parece ser bastante frequente. Um terço das estrelas de tipo solar tem esse tipo de planeta perto delas.
As propriedades desse novo tipo de planeta são bem diferentes daquilo que vínhamos descobrindo há alguns anos, que são planetas gasosos gigantes. O recorde é um planeta com uma massa 1,9 vez a da Terra. Estamos perto de achar um de massa igual ao nosso.
FOLHA – Como o sr. faz para detectar a presença desses planetas? Existem várias maneiras, não?
MAYOR -
A técnica que estou usando é a do efeito Doppler. Nós tentamos detectar mudanças nas velocidades de estrelas devido à influência gravitacional dos planetas. Mas, recentemente, nos últimos dois anos, grandes progressos foram feitos também por pessoas que estão procurando planetas em trânsito na frente de suas estrelas. É possível achá-los porque eles causam uma pequena queda na luminosidade.
Recentemente, houve uma descoberta interessante feita pelo satélite francês Corot, que achou planetas com poucas vezes a massa da Terra. Estou certo de que nos próximos dois anos temos uma chance bastante grande de detectar um planeta com massa tão pequena quanto a da Terra.
FOLHA – Isso vai acontecer com a técnica que o sr. usa ou com as técnicas usadas pelo Corot?
MAYOR -
Com as duas. Nós estamos competindo, e as técnicas são complementares.
FOLHA – Alguns poucos estudos relataram ter conseguido ver planetas diretamente. Isso é uma técnica promissora também?
MAYOR -
Sim, mas a luz direta é uma técnica bem diferente. Uma vez que o planeta esteja atrás da estrela, você tem uma pequena queda da luminosidade infravermelha. Isso é um tipo de detecção direta. Outra, direta, é a produção de imagem com óptica adaptativa avançada, uma técnica que corrige a turbulência da atmosfera. Aí você consegue ver pontos minúsculos perto da estrela.
FOLHA – Quantos planetas seu grupo detectou até agora desde 1995, quando achou o primeiro?
MAYOR -
Grupos do mundo inteiro detectaram até agora cerca de 350 planetas. Eu e minha equipe podemos reivindicar a descoberta de 150 deles.
FOLHA – Agora que vocês conhecem tantos planetas, é possível dizer se o Sistema Solar é especial?
MAYOR -
Temos de ser cautelosos com essa pergunta, porque a amostra de planetas que temos na verdade é ainda pequena. Mas, ao que parece, o Sistema Solar não é nem de longe um exemplo típico. Em todos os sistemas nos quais descobrimos planetas gigantes, eles têm órbitas muito excêntricas [ovaladas], enquanto no Sistema Solar elas são mais circulares.
Com relação aos planetas de baixa massa, descobrimos sistemas com diversos planetas com massa da escala de duas Terras, orbitando perto da estrela, o que não existe no Sistema Solar. Então, em muitos aspectos, o Sistema Solar é diferente daquilo que temos visto.
Mas ainda não podemos dar declarações definitivas. A visão que temos ainda é enviesada.
FOLHA – O que fez o número de planetas detectados aumentar tanto desde 1995? Foi o poder dos telescópios ou os astrônomos aprenderam a olhar para os lugares certos?
MAYOR -
Os telescópios tiveram avanços importantes, mas não no poder de coletar luz, que está relacionado ao tamanho do telescópio, e sim na instrumentação. Por exemplo, a precisão típica que tínhamos 15 anos atrás, quando descobrimos o planeta 51 Pegasi b [medindo a velocidade de sua estrela-mãe] era de 51 metros por segundo. Hoje chegamos a uma precisão de 3 m/s.
FOLHA – A detecção de um planeta na zona “habitável”, onde a água líquida está presente, será possível?
MAYOR -
Sim, na verdade, três meses atrás, quando anunciamos a descoberta de um planeta novo em torno da estrela Gliese 581, nós corrigimos os parâmetros orbitais de um planeta mais nesse sistema. É um planeta com sete vezes a massa da Terra, localizado na “zona habitável” na órbita da estrela.
FOLHA – Os instrumentos já têm capacidade de investigar a química desses planetas?
MAYOR -
Já houve alguns avanços na análise da composição atmosférica. Mas estamos longe de ter capacidade de detectar a chamada “assinatura” química que a vida deixaria num exoplaneta igual à Terra.
FOLHA – Quinze anos atrás, quando o sr. achou o primeiro exoplaneta, já imaginava que hoje teríamos conseguido achar mais 350?
MAYOR -
Absolutamente, não. Quando descobrimos aquele planeta, era apenas um. Não tínhamos como extrapolar dados para estimar quantos mais poderiam ser detectados. Um ano depois, quando apareceram alguns outros, começamos a pensar: “OK, temos chance de ver mais deles; não é um objeto tão raro”. Ainda assim, ninguém imaginava que o campo de pesquisa cresceria tanto. Hoje, há alguns milhares de pessoas trabalhando nisso.
FOLHA – Quando o sr. descobriu 51 Pegasi b, estava procurando planetas deliberadamente ou houve um componente de sorte?
MAYOR -
Nós construímos os instrumentos para conseguir captar com precisão as velocidades e, assim como outros astrônomos, tivemos de fazer pedidos de tempo de observação para o comitê que controlava os telescópios. Ainda hoje temos de fazer isso, e sempre está escrito nos requerimentos que a intenção é detectar planetas gigantes. Não foi sorte.
FOLHA – O que está acontecendo de importante sobre exoplanetas aqui no encontro do Rio?
MAYOR -
Uma coisa importante é que três anos atrás nós não tínhamos nenhuma comissão sobre exoplanetas na IAU. Quinze anos atrás não existia nada mesmo e, há poucos anos, demo-nos conta de que o campo é muito importante. Hoje já existem inúmeras conferências internacionais sobre o assunto, talvez até demais.

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